Preço do café em alta devido à fruta fedorenta

Um conjunto complexo de variáveis econômicas e ambientais nas principais áreas de cultivo de café está resultando em um aumento significativo nos preços da commodity a nível global. Essa conjuntura desafiadora tem impactado diretamente o mercado internacional do café, gerando repercussões tanto nos aspectos econômicos quanto ambientais.

Mulher fazendo café durante festival no Reino Unido Foto: Getty Images / BBC News Brasil Reprodução: https://www.terra.com.br/

Quanto é considerado caro demais para uma xícara de café? Preços como 5 libras (R$ 36) em Londres ou 7 dólares (R$ 38) em Nova York por uma única xícara de café podem soar exorbitantes para alguns, mas poderão em breve se tornar uma realidade diante de uma conjunção de fatores econômicos e ambientais nas principais regiões produtoras de café ao redor do mundo. A analista Judy Ganes destaca que o custo dos grãos não torrados em negociação nos mercados globais atingiu um patamar “historicamente alto”. Especialistas apontam uma série de razões, como problemas nas safras, questões de mercado, estoques esgotados e até mesmo a presença da fruta mais malcheirosa do mundo.

Em 2021, uma geada devastadora atingiu plantações de café no Brasil, maior produtor mundial de grãos arábica, comumente utilizados em cafeterias. A escassez resultante levou compradores a buscarem grãos em países como o Vietnã, principal produtor de grãos robusta, geralmente utilizados em misturas instantâneas. Contudo, os agricultores vietnamitas enfrentaram uma severa seca que afetou diretamente a produção de café. Mudanças climáticas têm impactado o desenvolvimento dos cafezais, conforme aponta Will Frith, consultor do setor em Ho Chi Minh, refletindo assim na oferta de grãos. Com essa conjuntura, os agricultores vietnamitas migraram para o cultivo de uma fruta polêmica e popular na China: o durian. A participação de mercado do durian vietnamita na China quase dobrou entre 2023 e 2024, levando alguns a estimarem que o cultivo da fruta pode ser até cinco vezes mais lucrativo que o café.

Enquanto o durian ganhava espaço na China, as exportações de café robusta caíram significativamente em junho, com estoques próximos do esgotamento, segundo a Organização Internacional do Café. Países como Colômbia, Etiópia, Peru e Uganda se destacaram, porém sem produção suficiente para suprir o mercado. A demanda por café robusta está em alta, mas a oferta não acompanha, resultando em preços quase recordes nos mercados de commodities para ambos grãos, robusta e arábica. Renato Garcia Ribeiro, especialista do Cepea (Centro de Estudos Avançados em Economia Aplicada) da Esalq/USP, aponta que a elevação dos preços está muito mais associada aos impactos climáticos do que ao cultivo de durian.

A incerteza quanto aos preços do café no mercado global se torna evidente. O atacadista Paul Armstrong prevê que em breve, apreciadores de café poderão ter que desembolsar mais de 5 libras por uma única dose no Reino Unido. Armstrong ressalta que a situação atual se configura como uma verdadeira “tempestade perfeita”. Diante desse cenário, ele se vê obrigado a repassar os custos mais altos para seus clientes, considerando que seus estoques estão se esgotando. Will Frith observa que certos segmentos da indústria de café serão mais impactados que outros, especialmente o café em grande escala, como o instantâneo, de supermercado ou nas lojas de conveniência, todos com preços em ascensão.

Os números da indústria indicam que o alto preço de mercado do café não necessariamente implica em preços mais elevados para o consumidor final. Felipe Barretto Croce, CEO da FAFCoffees no Brasil, destaca que o aumento de preços está mais relacionado a fatores inflacionários gerais, como aluguel e mão de obra, do que diretamente aos grãos. Croce sugere que, considerando o café como um bem de luxo, ainda é acessível para quem o prepara em casa. Além disso, o aumento dos custos dos grãos de qualidade inferior torna o café de alta qualidade uma opção mais viável no mercado. Na visão de Croce, a próxima safra de café no Brasil, fundamental para o mercado global, é de extrema importância para determinar o futuro dos preços e da oferta.

No longo prazo, as mudanças climáticas representam desafios sérios para a indústria global de café. Estudos indicam que mesmo com medidas para reduzir as emissões de gases do efeito estufa, a área propícia para o cultivo de café pode ser reduzida em até 50% até 2050. Uma alternativa mencionada por Croce é a implementação de um “prêmio verde”, um pequeno imposto sobre o café repassado aos produtores para investir em práticas agrícolas sustentáveis, visando proteger e manter a viabilidade das terras de cultivo. Embora no presente as frutas aromáticas possam ser parcialmente responsáveis pelo aumento dos preços do café, a mudança climática pode representar um obstáculo ainda maior para a acessibilidade do café nos próximos anos.

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