A influência das línguas na forma de pensar segundo um linguista americano que cresceu com indígenas na Amazônia

Linguista Caleb Everett, que conviveu desde a infância com o povo indígena pirahã em Rondônia, discute a diversidade linguística e como isso molda a percepção de mundo das pessoas.

Língua do povo indígena pirahã é foco central de um polêmico debate acadêmico há décadas Foto: DANIEL EVERETT / BBC News Brasil Reprodução: https://www.terra.com.br/

A diversidade linguística presente no mundo reflete não apenas a forma como nos expressamos, mas também a maneira como percebemos e pensamos sobre o mundo. O linguista americano Caleb Everett, que cresceu convivendo com o povo indígena pirahã na Amazônia, apresenta em seu livro as diversas nuances das línguas em relação aos conceitos básicos como tempo, espaço e números.

Everett destaca que muitas culturas possuem visões e concepções diferentes sobre tais aspectos, demonstrando que a língua influencia diretamente a cognição e a forma de interpretação da realidade. Ele viveu uma infância atípica, dividindo-se entre os Estados Unidos e aldeias indígenas na região amazônica, o que o permitiu desenvolver uma sensibilidade única para entender como diferentes idiomas moldam a percepção dos indivíduos.

Ao analisar as línguas amazônicas, Everett aponta que algumas possuem uma riqueza lexical impressionante para descrever um mesmo conceito, como o tempo. Enquanto algumas línguas possuem uma variedade de palavras para expressar nuances temporais, outras podem sequer ter uma definição clara de tempo, como é o caso da língua Tupi Kawahib. Essas diferenças profundas vão além de simples aspectos culturais, influenciando a base do pensamento humano e a forma como cada indivíduo percebe o mundo ao seu redor.

O estudo das línguas indígenas na Amazônia desafia conceitos estabelecidos anteriormente por intelectuais, como a ideia de uma ‘gramática universal’ proposta por Noam Chomsky. Através de sua pesquisa, Caleb Everett aponta que a diversidade linguística evidencia a inexistência de categorias universais para classificar ideias e objetos, refutando a ideia de que todas as línguas humanas compartilham uma estrutura comum.

Além disso, a aceleração tecnológica tem possibilitado avanços significativos no estudo das línguas, permitindo uma compreensão mais ampla da diversidade linguística. No entanto, o linguista alerta para a urgência em documentar e estudar essas línguas, uma vez que muitas delas estão desaparecendo em um ritmo acelerado. As pressões econômicas e sociais levam ao declínio de línguas indígenas, colocando em risco não apenas a diversidade linguística, mas também a forma única de pensar e perceber o mundo presentes nessas comunidades. O contato com a modernidade e a imposição de línguas dominantes representam um desafio para a preservação e o respeito pela pluralidade linguística e cultural.

No contexto atual, a inteligência artificial surge como uma ferramenta que pode tanto auxiliar na documentação e preservação das línguas ameaçadas, quanto contribuir para a homogeneização linguística. Caleb Everett ressalta a importância de buscar uma amostragem representativa e menos tendenciosa das diferentes formas de pensamento humano, evitando generalizações a partir de um espectro limitado de culturas e idiomas predominantes. O diálogo e o respeito pela diversidade linguística são fundamentais para a manutenção da riqueza e da variedade de percepções que as diferentes línguas proporcionam.

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