Senado avalia ampliar número de deputados no Brasil
O Senado deve analisar nesta quarta-feira (25), um projeto de lei, anteriormente aprovado pela Câmara dos Deputados, que propõe ampliar de 513 para 531 o total de deputados federais. De acordo com cientistas políticos, essa alteração tende a intensificar as disparidades históricas na representação dos diferentes Estados no Congresso Nacional, agravando o já controverso desequilíbrio no sistema político brasileiro.

Senado vota nesta quarta-feira (25/6) projeto de lei, já aprovado pela Câmara, que aumenta o número de deputados federais, de 513 para 531 Foto: Wilson Dias/Agência Brasil / BBC News Brasil Reprodução: https://www.terra.com.br/
O Senado Federal pode analisar nesta quarta-feira (25/6) uma proposta que prevê o aumento do número de deputados federais de 513 para 531. O texto já passou pela Câmara dos Deputados no início de maio e, caso seja aprovado pelos senadores sem novas alterações, segue para avaliação do presidente Luiz Inácio Lula da Silva (PT). Lula terá um prazo de 15 dias úteis para sancionar ou vetar a medida.
A discussão deste projeto já havia sido inserida na pauta do Senado na semana passada, porém, a votação foi adiada devido ao feriado de Corpus Christi, que encurtou os trabalhos. Caso a lei seja sancionada, o novo total de deputados valerá já para as eleições de 2026, com os 18 parlamentares a mais tomando posse na legislatura de 2027. Com a mudança, nove Estados brasileiros serão contemplados com mais vagas na Câmara.
Apesar da tramitação, a medida encontra resistência entre os eleitores. Segundo pesquisa Datafolha divulgada na última semana, 76% dos brasileiros se dizem contrários ao aumento do número de deputados federais. Apenas 20% manifestam apoio à proposta, enquanto 2% não souberam opinar e 1% se declara indiferente ao tema. A polêmica gerou o debate: afinal, o Brasil necessitaria de mais deputados?
Para esclarecer o que está em jogo, o cientista político e professor da Fundação Getulio Vargas (FGV), Eduardo Grin, analisou os impactos do projeto de lei em discussão no Senado. Segundo Grin, o projeto apresentado pela Câmara surge como resposta a uma exigência do Supremo Tribunal Federal (STF) feita em 2023. Na ocasião, a Suprema Corte determinou que até 30 de junho de 2025, o Congresso promova uma atualização das representações estaduais na Câmara dos Deputados.
O motivo do requerimento do STF foi uma ação judicial do Estado do Pará, que argumentou que a quantidade de vagas distribuídas desde 1993 está desatualizada, já que houve aumento populacional em diversos Estados. Atualmente, a Constituição estabelece que a definição da quantidade de deputados federais por Estado deve ser feita por meio de lei federal, obedecendo aos dados mais recentes do Censo. Além disso, nenhuma unidade da federação pode ter menos de oito nem mais de 70 deputados.
O STF decidiu que, respeitando esses limites, o número total de assentos – atualmente 513 – teria de ser redistribuído proporcionalmente à população de cada Estado. Para atender à ordem judicial, seria necessário que unidades da federação que perderam população cedessem vagas para aquelas que cresceram. Contudo, para evitar o desgaste de retirar assentos de alguns Estados, a Câmara optou por ampliar o número total de deputados.
A proposta, agora em análise no Senado, cria 18 novas vagas para acomodar os Estados que registraram crescimento populacional, sem que aqueles que perderam habitantes sofram redução em seu número de representantes. O resultado desse arranjo, de acordo com especialistas, é uma intensificação do desequilíbrio histórico na representação parlamentar.
A distorção mais marcante do sistema permanece: Estados como Roraima continuarão com oito deputados – aproximadamente 1,5% do total de cadeiras – embora reúnam apenas 0,3% da população do país. Já São Paulo, que concentra 22% dos brasileiros, segue com menos de 14% das vagas. Para o Pará e o Ceará, Estados que mais reivindicaram maior representação, o acréscimo foi considerado insuficiente para corrigir as desigualdades históricas.
“Em vez de se debruçar sobre a revisão dos critérios mínimos e máximos de assentos por Estado, o Congresso preferiu uma solução que não contrarie os interesses de lideranças políticas já estabelecidas”, avalia Eduardo Grin. Ele ressalta que, como consequência, parte considerável da população segue sub ou super-representada. “Do ponto de vista da democracia, isso fere um princípio básico: o voto de cada cidadão deveria ter peso equivalente. Hoje, essa igualdade não existe – e continuará não existindo”, complementa o cientista político.
Grin aponta ainda que, por desrespeitar a regra constitucional de proporcionalidade, o aumento de deputados pode inclusive ser alvo de questionamento legal no STF. No entanto, segundo ele, é improvável que a Corte retome o tema em ambiente de tantos outros conflitos com o Legislativo. “Por isso, devemos considerar ‘superada’ essa discussão. Com a aprovação do projeto, é muito provável que a partir de 2026 o número de parlamentares aumente”, conclui.
Ele acrescenta que não espera um veto de Lula ao projeto: “[Lula] já lida com temas espinhosos no Congresso, como alterações no IOF e a reforma do Imposto de Renda. Assim, a tendência é que essa questão passe sem maiores impasses”.
No contexto internacional, o Brasil não foge do padrão: excetuando os Estados Unidos, que têm população maior e menos parlamentares nas duas Casas legislativas, outros países como Reino Unido, Itália, França e Alemanha possuem mais integrantes no Parlamento, mesmo com populações menores. Ainda assim, o Parlamento brasileiro está entre os mais caros do mundo.
De acordo com estudo de universidades norte-americanas e da UnB, em 2022 o custo anual de cada deputado brasileiro era próximo a R$ 24 milhões, o que coloca o Congresso Nacional como o segundo organismo legislativo mais dispendioso do planeta, atrás apenas dos Estados Unidos. A criação das 18 novas cadeiras pode elevar o gasto público em mais de R$ 64 milhões por ano.
Apesar desse impacto fiscal, o presidente da Câmara, Hugo Motta (Republicanos-PB), argumenta que os recursos necessários já estão previstos no orçamento do órgão.
Para Eduardo Grin, a discussão sobre o número de parlamentares não é o ponto central. “Para a democracia, o essencial é ter regras claras e compreensíveis para a sociedade, garantindo que todos os Estados sejam representados proporcionalmente dentro da Câmara”, defende o professor da FGV.