Banco Central busca independência total do governo
Com a total autonomia, haveria a concentração de poder absoluto, eliminando os mecanismos de freios e contrapesos que são característicos de um Estado democrático de direito.
O renomado economista brasileiro Roberto Campos, figura proeminente na comissão nacional em Bretton Woods, participante da fundação do FMI e do Banco Mundial, costumava afirmar que no Brasil, uma empresa privada é aquela controlada pelo governo, enquanto uma empresa pública é aquela que não está sob o controle de ninguém.
Atualmente, o presidente do Banco Central, neto de Campos, está liderando uma iniciativa para criar uma empresa pública inédita. Esta não seria uma empresa comum, mas sim a estatal mais poderosa de todos os tempos: a empresa pública Banco Central do Brasil. A proposta é que esta nova estatal possua amplos poderes normativos, regulatórios e de fiscalização, ficando isenta de supervisão ministerial. É uma busca por grande autonomia sem a devida responsabilidade. O projeto de alteração proposto na PEC n.º 65/2023, sob relatoria do senador Plínio Valério (PSDB-AM), visa ampliar a autonomia financeira e orçamentária, concedendo ao Bacen a liberdade para gastar recursos públicos de forma mais abrangente, podendo potencialmente replicar os problemas de irresponsabilidade fiscal presentes em instituições com autonomia semelhante.
Atualmente, o Banco Central já goza de autonomia operacional de acordo com a Lei Complementar n.º 179/2021, o que lhe permite tomar decisões sem necessitar de autorização de outros órgãos. Iniciativas como Open Finance, Pix e Drex foram implementadas em um contexto em que o banco não possuía autonomia formal. A autonomia recente de 2021 ainda necessita de uma avaliação mais aprofundada. É crucial que as decisões sejam embasadas em evidências, não se restringindo apenas às políticas sociais. Se há dados que demonstram melhorias na política monetária desde 2021, estes devem ser apresentados e debatidos.
Com a super autonomia proposta pela PEC 65, o Banco Central teria poder absoluto sobre os bens e políticas públicas que administra, eliminando os controles e contrapesos essenciais de um Estado democrático. Esta transformação tornaria o BC uma estatal praticamente sem controle. Neste novo modelo proposto, o Banco Central não atuaria como guardião da moeda, mas sim como seu proprietário, menosprezando as opiniões dos representantes do povo. Os funcionários do Banco seriam os únicos autorizados a opinar sobre os rumos a serem tomados, o que poderia tornar a instituição mais suscetível à captura e influência do poder econômico.
A proposta é questionável quanto à sua constitucionalidade, pois carece de iniciativa do presidente, prerrogativa conferida pela Constituição para propostas dessa natureza. Entretanto, a decisão do Supremo Tribunal Federal (STF), uma instituição dotada de autonomia similar, em validar a Lei 179/2021, que sofria do mesmo vício, coloca em xeque a relevância deste argumento. Estamos diante de uma ironia peculiar, onde o neto do renomado economista Roberto Campos propõe a criação de uma estatal extremamente autônoma e poderosa, levando ao extremo a observação de seu avô.